Governo e oposição merecem SeverinoKennedy Alencar, colunista da Folha Online, é repórter especial da Sucursal de Brasília da Folha de S.Paulo.
09/09/2005
As causas da eleição de Severino Cavalcanti (PP-PE) para presidente da Câmara foram principalmente duas: incompetência política do governo e irresponsabilidade da oposição. Eleito na madrugada do último dia 15 de fevereiro, Severino chegou ao atual posto numa noite em que todo mundo deu um tiro no pé, expressão que serviu de título a uma Pensata na mesma data.
Naquele momento, antes da grave crise política instalada faz mais de três meses, a eleição de Severino foi um claro sinal de que já estava ameaçada a continuidade do projeto de poder do PT.
Naquela madrugada, Lula "começou a perder a reeleição", disse um deputado do PFL a este jornalista, contente com a derrota do candidato do governo e do PT, Luiz Eduardo Greenhalgh (SP).
O pefelista tinha razão. Mas aquela noite também foi a noite em que a Câmara deu início ao seu mais forte processo de desmoralização. Políticos nunca tiveram boa imagem. É natural a população desconfiar deles. O Brasil real está aí para justificar tal desconfiança.
No entanto, nunca o Legislativo brasileiro se mostrou tão mesquinho como naquela noite. Elegeu presidente da Câmara um deputado federal do "baixo clero" _congressistas sem visibilidade pública, mas muito interessados em benesses públicas.
Severino fez carreira no pior tipo de conservadorismo católico e em negociações congressuais as mais miúdas. Agora, a entrevista de um concessionário de restaurante da Câmara mostrou que ele também é versado em extorsão.
Severino teve 300 votos entre os 498 parlamentares presentes no segundo turno. Foi eleito pela ampla maioria da casa.
O PSDB e o PFL, que hoje dizem que Severino não tem condição de presidir a Câmara, já sabiam disso naquela noite. E votaram nele, com honrosas exceções. O governo Lula, derrotado no triste episódio, deu a Severino o poder de indicar um ministro, sem contar a nomeação de um filho para um cargo público em Pernambuco y otras cositas más.
Governo e oposição fizeram por merecer Severino. Um castigo para a classe política como há muito não se via. Agora, a classe política pagará o pato como um todo, dos incompetentes do PT aos hipócritas do PFL e do PSDB.
Tomara que os políticos tenham aprendido a lição e que ajam com mais responsabilidade na atual crise política. Um bom começo será cassar Severino e todos os que mereçam o mesmo destino na crise do mensalão.
Mas será preciso mais do que investigar profundamente as acusações de corrupção. Ao final desse necessário processo, será fundamental que a política brasileira não se transforme numa guerra permanente, na qual um grupo dinamitará o outro até lhe tomar o poder e assim por diante. O PT vê hoje como errou ao exagerar nos ataques a FHC. Setores do PSDB parecem mais interessados em vingança do que em investigar denúncias de corrupção.
O maior risco que o Brasil corre é que seus políticos, sejam do governo, sejam da oposição, não estejam à altura dos desafios e problemas do país.
Honrosa exceção
Por questão de Justiça, segue um merecido registro: o prefeito de São Paulo, o tucano José Serra, fez articulações até a última hora para que o PSDB votasse em Greenhalgh para presidente da Câmara. Serra teve grandeza naquele momento.
Lula não é Severino
Como Lula não é Collor, Lula também não é Severino.
O presidente da República tem cometido um erro político atrás do outro. E está pagando caro por isso.
No entanto, é injusta a comparação frequentemente feita entre ele e Severino, como se fossem farinha do mesmo saco por serem de Pernambuco e não terem educação formal. Eles não são farinha do mesmo saco. Um avaliação equilibrada leva à conclusão de que se trata de políticos bem diferentes.